Casa de São Domingos Sávio em Riva di Chieri, onde ele nasceu.
Em toda a sua existência, a Igreja sempre nos propôs como modelos aqueles fieis que souberam viver heroicamente suas virtudes. E quando o brilho de suas vidas era tal a ponto de ser confirmado por milagres ocorridos por sua intercessão após a morte, eles passavam a nos ser propostos não somente como modelos, mas também como intercessores. Assim são os santos.
Desde o princípio, há santos de todos os tipos: homens, mulheres, ricos, pobres, doutos, pouco (ou nada) letrados, mártires, confessores, sacerdotes, religiosos, leigos… A graça de Deus não se impõe limites quando toca uma alma generosa que docilmente deixa-se conduzir à perfeição!
Conhecer a vida de um santo pode ser algo inspirador quando quem se propõe a fazê-lo abre-se a essa mesma graça de Deus. Foi assim que travei conhecimento com São Domingos Sávio, há tantos anos que não me lembro nem mais quantos fazem. Eu já tinha minhas devoções particulares, especialmente com São Francisco e Santa Clara de Assis, que conheci mais a fundo durante dois anos de experiência na vida religiosa franciscana, em 2002 e 2003. Tempos depois, tornando à vida laical, retomei minha antiga atividade como catequista, na etapa da Perseverança (10 a 13 anos de idade). A minha grande preocupação então (que é a mesma ainda agora) era propiciar aos jovens uma experiência pessoal e concreta do amor de Deus, travando conhecimento com Jesus Cristo por meio de sua Igreja.
Era fácil perceber qual caminho deveria percorrer. Mas ainda faltava algo…
Era preciso, além do meu testemunho pessoal de adulto jovem, que houvesse alguém mais próximo daquelas crianças e adolescentes. Alguém que estivesse na mesma etapa da vida que eles, que vivesse situações semelhantes no dia-a-dia, que tivesse os mesmo anseios, dúvidas e esperanças e, principalmente, que em tudo isso tivesse se deixado moldar por Deus para a perfeição a que Jesus nos convida no Evangelho. Ao procurar este exemplo, alguém (não me lembro mais quem foi) me falou sobre o jovem Domingos Sávio. Procurei saber mais sobre ele, e consegui obter um pequeno livrinho de sua biografia, de autoria do padre salesiano Terésio Bosco.
Ao ler aquelas páginas, me encantei com a figura tão concreta deste santo que morreu na flor da juventude! Sua vida era narrada como uma existência palpável, e não só atendia às expectativas que eu tinha para que fosse algo de apelo aos meus jovens, como também trazia um elemento de apelo universal, isto é, sem limite de idade: DOMINGOS DESEJOU SER SANTO, E FEZ DE TUDO PARA CONSEGUIR CUMPRIR ESTE INTENTO. Ele viveu este ideal com esforço, buscando cada dia valer-se de meios para se tornar melhor aos olhos do bom Deus, servindo-o e amando-o de todos os modos possíveis: na devoção à Eucaristia e a Maria Santíssima, na fidelidade ao cumprimento dos seus deveres, no serviço ao próximo e na experiência da alegria que nasce naturalmente de saber-se amado por Deus, a despeito de todas as dificuldades que a vida possa impor. E tudo isso antes de completar 15 anos!
Procurei um santo para servir de modelo aos meus jovens, e ele acabou fazendo isso por mim em primeiro lugar! Se eu narrar aqui os fatos da vida de Domingos Sávio que me encantam, me alongarei demais (e também estragarei a surpresa de tantos quanto lerem este texto que decidirem se aventurar a conhecer sua história, como eu fiz). Ao invés disso, quero partilhar um pequeno testemunho.
Se ler sobre um santo nos inspira a imitá-lo, o que falar então sobre pisar a terra que ele pisou e passar pelos lugares que ele viveu? Foi essa experiência que pude fazer no ano passado, ao visitar Turim e seus arredores, as terras onde São Domingos Sávio nasceu, viveu e morreu. Antes de tudo, visitei seu túmulo, localizado numa capela lateral na Basílica de Nossa Senhora Auxiliadora. Ali, rezando diante de sua urna funerária, travei diálogo com ele como que falando a um amigo, pedindo-lhe que me ensinasse a ter a coragem e a virtude de almejar a santidade como ele um dia o fez. Após a Santa Missa, voltei ao local onde descansa seu corpo e, em novo diálogo, lhe disse que me dirigiria agora a duas das casas onde ele viveu, uma em Mondônio e outra em San Giovanni, ambas a cerca de 20km de Turim, e que desejava com alegria que aquelas visitas tivessem êxito.
Indo primeiro a Mondônio, conheci a casa onde ele morreu santamente em 9 de março de 1857. A casinha é a primeira à esquerda, seguindo pela entrada do povoado (que ainda hoje tem em torno de apenas 200 habitantes!). Eu já havia visto o lugar em fotos antes, mas estar lá era bem diferente. Ao me informar sobre como poderia visitá-la, me disseram ser necessário pegar a chave do local com a vizinha. Uma senhora alegre e prestativa, a despeito da barreira do idioma, me atendeu e me deixou com as chaves do local, pedindo apenas que eu não esquecesse de trancar tudo antes de devolvê-las! Pude ver cada acomodação do local (inclusive o quarto no qual o pai de Domingos teve uma visão dele no paraíso apenas um mês após sua morte) e rezar diante de suas relíquias. Que amabilidade do santo em me acolher assim, com tanta familiaridade!
De Mondônio, segui para San Giovanni. Chegando à casa onde ele nasceu, encontrei o local fechado. Na praça em frente ao local, havia uma família (dois irmãos e um primo, com a esposa de um deles e vários filhos e sobrinhos) que ficou curiosa ao me ver em roupas tão diferentes (eu estava com meu uniforme escoteiro) e, ao saberem que eu havia peregrinado desde o Brasil, se espantaram grandemente. Como o local estivesse fechado e a responsável pelas chaves, contactada por telefone, não quisesse abri-lo para mim por estar fora do horário habitual (eram 22h30!), pus-me a conversar com eles e decidi que iria dormir no carro, para aguardar que o local abrisse no dia seguinte. Um deles, então, conseguiu em segredo uma chave reserva com outra pessoa, e o acesso à casa me foi franqueado. Ao entrar, imediatamente verti lágrimas na humilde sala que agora era uma modesta capela (inclusive com a presença do Santíssimo Sacramento). Vi todas as acomodações do local e rezei diante da famosa pintura de São Domingos Sávio feita por Mario Caffaro-Rore, que eu nem sabia que ficava naquele local.
Numa circunstância normal, eu acharia tal “invasão” um tanto estranha, ainda mais para um escoteiro. Mas não pude deixar de perceber ali a ação da providência e da misericórdia de Deus, que permitiu a São Domingos Sávio que pudesse me acolher, por meio daquelas pessoas, também nesta outra casa. Agradeci-lhes imensamente este verdadeiro presente, e ainda hoje mantemos contato.
Estes são relatos simples, quase bobos, eu diria. Mas tiveram grande significado para mim, tanto é que afirmo com convicção que estas visitas aos lugares onde viveu e morreu São Domingos Sávio foram o verdadeiro ponto alto de minha viagem à Europa no ano passado, a despeito de tantas outras coisas maravilhosas que ocorreram naquelas semanas, inclusive um encontro cara a cara com o Santo Padre (esse foi o segundo fato mais importante desta viagem, ao contrário do que pensa a maioria das pessoas). E digo tudo isso por um motivo simples: conhecer estes locais tornaram a figura de São Domingos Sávio ainda mais concreta para mim, e reforçaram em meu coração a vontade de viver o mesmo ideal de santidade que ele viveu. Parece algo grande demais? Sim, parece. Mas se Deus inspirou no coração de Domingos este desejo de santidade, e se ele conseguiu realizá-lo nas coisas pequenas e cotidianas, eu quero fazer o meu melhor para seguir seu exemplo, ao mesmo tempo em que o proponho para meus jovens e queridos escoteiros, que o têm por padroeiro.
Assim dizia São Domingos Sávio: “Io non sono capace di fare cose grandi. So fare solo questo piccole cose. Spero che il Signore, nella sua bontà, le gradisca”. (“Eu não sou capaz de fazer grandes coisas. Faço apenas estas coisas pequenas. Espero que o Senhor, em sua bondade, se agrade delas”).
Que o bom Deus me permita fazer o mesmo, a despeito de quem sou.
Semper Parati.
Ch. Leonardo Seville, RP
Distrito de Brasília