No escotismo fazemos a aposta de confiar em cada um. É a educação dos jovens pelos jovens, graças à magnífica rede de confiança que nos liga
“A confiança é a capacidade infantil de ir ao encontro do que não conhecemos, como se o conhecêssemos” (Christian Bobin).
Sim! Uma criança tem esta facilidade espontânea para viver a confiança. Nossa ansiedade de adultos vem de nossa lucidez: somos mais conscientes dos riscos e dos perigos. “Mas esta lucidez não deve enfraquecer nossa audácia, nossa capacidade de ir avante. Confiar em si mesmo é continuar a ter um coração de criança, uma alma de criança em um espírito adulto”, recomenda Charles Pépin, para quem a confiança é uma filosofia.
Se a origem latina do verbo “confiar” (confidere: cum, com, diere, fiar), temos que confiar significa remeter a alguém algo de precioso, fiando-se a ele, depositando confiança em sua bondade e em suas boas intenções.
Ramo Amarelo
Na Associação de Guias e Escoteiros Católicos do Brasil (AGEBR-FSE), observamos no ramo amarelo:
“O lobinho (a lobinha) escuta a voz do velho lobo. O lobinho (a lobinha) não escuta a si mesmo(a)”: é a lei da alcatéia (da clareira). Porque entre 8 e 12 anos de idade nós devemos escutar com confiança aqueles que detêm a sabedoria a nos ensinar. Por sua parte, “o lobinho (a lobinha) se compromete a sempre falar a verdade”: nós podemos nele(a) confiar. No momento da promessa de um(a) pata tenra, o Akéla sonda toda a alcatéia (a clareira): “Lobinhos (lobinhas), nós vamos receber fulano (a) na nossa alcatéia (clareira)? Vocês pensam que ele(a) será um(a) bom(a) lobinho(a)?”, ou seja, “Ele(a) é digno de confiança?” A confiança se exerce e é provada na comunidade.
Depois, no Ramo Verde:
“A honra do escoteiro é ser merecedor de confiança”. Este é o primeiro artigo de nossa Lei Escoteira! “Porque a Corte de Honra confia em você…”, diz-se no começo do compromisso de promessa.
Honra e confiança são inseparáveis no escotismo na idade dos 12 aos 17 anos.
A promessa escoteira apóia-se, inclusive, sobre as três virtudes: franqueza, dedicação e pureza. Três pilares de confiança. “Podem contar com minha palavra de escoteiro”: comprometer-se a manter sua palavra é testemunhar que se pode duravelmente confiar em nós.
O escotismo é também o aprendizado da confiança por meio da autonomia e da responsabilidade: “Nunca ajude uma criança a fazer uma tarefa que ela se sente capaz de cumprir”, repetia sem cessar Maria Montessori. Confiar não é fazer no lugar de alguém, mas deixar fazer.
A um (a) Chefe de Patrulha confiamos alguns escoteiros ou guias: nós confiamos nele(a). E sua investidura permite-nos oficializar este elo de confiança e inseri-lo(a) nesta grande corrente que une todas as pessoas que exercem responsabilidade na FSE.
“As palavras que vêm do coração bastam para dar confiança para sempre. Alguém pode nos transmitir confiança sem grandes discursos nem palavras de encorajamento, mas simplesmente nos confiando uma missão…” (Charles Pépin).
Os membros de uma patrulha (ou de uma companhia) podem, por sua vez, comprometer-se, confiar neste(a) Chefe, a(o) qual prometeram obedecer. “Vocês podem contar comigo”, responde seu(sua) Chefe. Em contrapartida “a patrulha conta com cada um de seus membros”, notadamente através de suas tarefas nos postos de ação. Trata-se de um verdadeiro círculo virtuoso, porque é recíproco.
No Ramo Vermelho
No ramo vermelho, os(as) jovens respondem “Estar pronto(a)”, depois, “Servir”. São, igualmente, uma boa maneira de dizer: “vocês podem confiar em mim, estou aqui, pronto(a) para servir”.
Quanto à investidura de um(a) Chefe, lemos explicitamente no cerimonial: “De acordo com a hierarquia do movimento, decidimos confiar em você…” e sua resposta imediata “Eu te agradeço por esta confiança e aceito este serviço”. Sim, a confiança não é algo que se nos é devido: nós a recebemos como um presente precioso, cheios(as) de gratidão. A confiança nos responsabiliza em nos tornarmos dignos dela e de, por nossa vez, transmiti-la.
Admirar seu Chefe ou todo escoteiro ou guia por causa de seu comportamento exemplar ajuda-nos a construir a confiança em nós mesmos, pois “a cada vez que você admira, você contempla o brilho de uma estrela em particular. Cada vez, você vê o possível brilho da estrela que está em ti”, diz-nos o filósofo Charles Pépin.
Conselho
E como ponto de apoio, como um pilar, o Conselho é o órgão que garante que a confiança sempre se faz presente, vivida no seio das unidades e entre as pessoas que possuem responsabilidade no Movimento. A confiança não é, contudo, cega. Ela não exclui o controle, recorda-nos um velho ditado. A pedagogia dos Conselhos é a pedagogia da confiança: crer no outro, quer dizer, crer em suas capacidades em fazer algo, em suas competências, e mais ainda, crer e reconhecer sua capacidade de ser.
Em síntese, no escotismo fazemos a aposta de confiar em cada um. É a educação dos jovens pelos jovens, graças à magnífica rede de confiança que nos liga: aquela da investidura, encarnada e transmitida no seio do Movimento, dos Comissários Nacionais até o Chefe de Patrulha.
A confiança interpessoal e no interior de um grupo existe porque existe, primeiramente, aceitação recíproca de uma regra de vida comum, partilhada: a lei escoteira, o regimento, os diferentes compromissos… e, igualmente, porque estas regras do jogo, estas palavras dadas, longe de nos sufocar, oferecem um espaço seguro, no qual as liberdades podem desabrochar, com confiança, com otimismo. Baden-Powell confirma: “O otimismo é uma forma de coragem que nos leva a confiar nos outros, e que nos leva ao sucesso”.
Sim, é graças, e tão somente graças a esta confiança que se pode viver uma aventura! Pois é preciso confiança para aprender a sair de sua zona de conforto, para se virar com meios simples, para se dar objetivos, a fim de progredir, para ousar aventurar-se e para ser capaz de ajudar os outros.
É assim que se forja nossa auto-confiança.
Para concluir, lembre-se de que a confiança em si mesmo tem a ver com uma alquimia. Seus três elementos são:
A confiança no outro (que concerne nossa percepção do próximo, nossos sentimentos de pertença e de interdependência);
A confiança em si mesmo (que concerne nossa identidade: nossos sonhos, nossas esperança, nossos objetivos e nossos valores);
A confiança na vida (a relação com o mundo, que concerne nossas iniciativas e nossas ações).
A confiança tem a ver com transparência, bondade, coerência, inter-dependência e esperança.
O escotismo, de modo particular na pedagogia que oferece a AGEBR-FSE, existem muitos marcos que constroem homens e mulheres fortes, comprometidos e cheios de iniciativa. Homens e mulheres com os quais se pode contar, em quem podemos confiar. Isso porque a confiança é a garantia de que cada um dará seu melhor para o mundo.
Por isso, apoiemo-nos no grande modelo de confiança que é a Virgem Maria e seu Fiat, seu “Sim” ao mistério divino e à vida.
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Fonte: Site Le Rasso – Association des aînés et anciens Guides et Scouts d’Europe
(https://www.lerasso.com/news/le-scoutisme-ou-l-ecole-de-la-confiance-131)
Traduzido do original em língua francesa por frei André Luís Tavares, o.p.
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Escoteiros Católicos do Brasil: https://escoteiroscatolicos.com.br/site
União Internacional das Guias e Escoteiros da Europa: https://uigse-fse.org